Deputados estaduais adiaram nesta semana a votação definitiva do PLC 10/2015, que propõe novas formas de integração na região metropolitana. O texto foi alvo de mais de 200 sugestões de emendas. Modelo do conselho deliberativo e espaço reservado à sociedade civil foram alguns dos pontos criticados.
(Foto: Saulo Pereira Guimarães)
Os deputados estaduais fluminenses chegaram nesta semana a um consenso, algo raro na atual cena política brasileira. Após uma hora de discussão, membros da situação e da oposição concordaram na última terça (29/3) que precisam de mais tempo para analisar o modelo de integração da região metropolitana proposto pelo Governo do Estado. A decisão se refletiu no adiamento da votação definitiva do projeto de lei complementar nº 10, de 2015 (PLC 10/2015), que, entre outras coisas, institui medidas para governança compartilhada da área e agora não tem data para voltar ao plenário.
Do início ao fim da sessão, a proposta de autoria do governador Luiz Fernando Pezão recebeu mais de 200 sugestões de emendas por parte dos parlamentares. A decisão sobre temas de alcance metropolitano por um conselho deliberativo, os diferentes pesos dos votos dos integrantes desse conselho e o espaço reservado aos representantes da sociedade civil foram alguns dos aspectos do texto que geraram a insatisfação dos membros da Alerj (Assembleia Legislativa do estado).
Por isso, os parlamentares querem que sejam marcadas audiências públicas para discutir o tema. "Acreditamos que o assunto precisa ser melhor debatido", afirma Carlos Roberto Osório, deputado estadual pelo PSDB, partido que ajudou a eleger Pezão. "A principal falha é que não tivemos uma discussão madura para fazer a análise correta do projeto", defende Eliomar Coelho, do PSOL, da oposição. Para Vicente Loureiro, diretor do Grupo Executivo de Gestão Metropolitana (GEGM), novas reuniões para discutir o tema parecem "dispensáveis". "Mas vamos tentar incorporar ao máximo aquilo que enriquece e melhora o projeto", afirmou ele.
A proposta no centro da polêmica está na Alerj desde setembro de 2015. Seu principal ponto é a criação do Conselho Deliberativo da Região Metropolitana. O novo órgão teria a atribuição de cuidar de temas compartilhados por vários municípios da área, como saneamento básico, mobilidade urbana, enfrentamento de mudanças climáticas e meios de comunicação digital.
O conselho seria formado pelo Governo do Estado e pelos 21 municípios da região metropolitana. Nas decisões, o voto do Estado teria peso 30 e o peso do voto dos demais integrantes variaria em função do tamanho de sua população (veja o quadro completo no fim da matéria).
Os representantes do GEGM esclarecem que o modelo é baseado em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema publicada em 2013. "Não é justo, segundo o nosso entendimento, que o município de Tanguá ou de Paracambi tenha o mesmo peso de voto que a capital", afirma Vicente. Já os parlamentares veem o formato com reservas. "O estado fica muito forte em relação aos municípios", afirma Eliomar. Além disso, o fato do texto autorizar que o conselho aprove contratos em suas áreas de atuação também assusta deputados.
O temor é de que as cidades percam o direito de decidir sobre questões que hoje estão sob sua responsabilidade. "O município perde autonomia daquilo que é dele. A água é do município. O esgoto é do município. Mobilidade urbana é do município. E você está praticamente passando isso para o estado", explicou o Farid Abrão, ex-prefeito de Nilópolis e membro na Alerj do PTB, considerado aliado do governo.
De acordo com o GEGM, a intervenção do conselho vai se limitar às questões que afetam a Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ) como um todo. É bom lembrar que desde o acórdão do STF, a responsabilidade das áreas mencionadas por Farid não é mais apenas de um único ente governamental, mas compartilhada entre estado e municípios envolvidos. A mudança de concepção é a grande novidade da decisão em relação ao cenário jurídico anterior.
A criação de um conselho consultivo é outro ponto da proposta. Ele seria formado por 45 membros do poder público, setor empresarial, ONGs e outros segmentos da sociedade civil. O grupo monitoraria o planejamento e as ações relacionadas à RMRJ, mas sem participar das decisões. "O conselho consultivo a gente sabe que não serve para nada. Nossa proposta é uma câmara mais descentralizada e com maior participação da sociedade civil", afirmou Marcelo Freixo, do PSOL.
Além dos conselhos deliberativo e consultivo, o PLC estabelece uma agência executiva, responsável por conversar com secretarias e outros órgãos setoriais com a finalidade de pôr em prática o que for decidido, e um fundo de desenvolvimento da RMRJ.
O último ponto despertou a preocupação de Enfermeira Rejane, do PT do B. Na tribuna, ela destacou que a medida poderia representar aumento de gastos para o estado num momento delicado, em que nem o pagamento dos servidores está totalmente garantido. O texto prevê que os recursos para esse fundo venham de repasses municipais, estaduais e federais, doações e outras fontes.
É bom destacar que o Governo do Estado já conta com estruturas voltadas para região metropolitana. O GEGM é uma delas e conta hoje com 40 funcionários provenientes de secretarias do governo estadual. O grupo foi criado para coordenar o planejamento, implantação e gestão de iniciativas de caráter metropolitano. Sua certidão de nascimento é o decreto nº 44.905, de 2014, assinado por Pezão.
O mesmo documento cria a Câmara Metropolitana de Integração Governamental do Rio de Janeiro, que engloba o GEGM e existe para pensar políticas públicas e novas formas de governança para a RMRJ. Uma de suas atribuições é pensar um plano estratégico para o desenvolvimento da região. O objetivo de todo esse esforço é aumentar a integração entre os 21 municípios.
Mas, ao que tudo indica, há uma longa estrada pela frente. Os líderes da Alerj pretendem se reunir nos próximos dias para discutir melhor o PLC 10/2015. Só depois disso, o projeto deve voltar ao plenário e, caso haja seja aprovado, suas medidas poderão ser implantadas. Até lá, o consenso entre os deputados é de que o melhor a fazer no momento é não arriscar.
A série Desafios na integração da região metropolitana do Rio aborda em três reportagens os obstáculos na implantação de novas formas de governança na região metropolitana do Rio sob o ponto de vista de parlamentares, especialistas e representantes de prefeituras envolvidos no processo.
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