Num Rio em transformação, quais modelos de turismo são possíveis e desejados? Especialistas discutem maneiras de valorizar a cidade para além da natureza exuberante que incluam os subúrbios e novos atrativos culturais. Assista ao vídeo.
"O Rio de Janeiro não é uma cidade maravilhosa. É uma paisagem maravilhosa para uma cidade." A frase de Elizabeth Bishop, poeta americana que viveu no Brasil nos 1960 e 70 e que mantinha uma relação de amor e ódio com o país, em especial com o Rio de Janeiro, foi citada várias vezes pelos participantes do OsteRio realizado no dia 15 de setembro de 2014.
Assista ao vídeo do evento:
Definitivamente, a paisagem é o principal atrativo turístico da cidade. Mas, a Cidade Maravilhosa, conhecida pelos seus belos cenários da natureza, tem passado por um forte processo de transformação urbanística e ganha novas atrações. “O desafio colocado para o Rio de Janeiro é agregar ainda mais valor a esses ativos”, ressaltou David Zylbersztajn na abertura do evento. Para discutir o tema "Além das praias e do samba: o futuro do turismo no Rio de Janeiro", o IETS convidou Pedro de Lamare, empresário e presidente do SindRio; Washington Fajardo, arquiteto, urbanista e presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade; e Luís Marcelo Mendes, consultor de comunicação.
Aproveitar as potencialidades
Pedro de Lamare é presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes (SindRio) e um dos sócios do Restaurante Gula Gula, do qual seu pai, Fernando de Lamare, foi um dos fundadores. O empresário enfatizou a necessidade de investir no planejamento do setor turístico. "O mais importante é definir um modelo de turismo para o Rio de Janeiro que possa aproveitar e desenvolver ainda mais toda essa potencialidade que cidade já possui".
O empresário propôs a criação de um conselho não-governamental para organizar e discutir as questões do setor, conjugando empresários de entretenimento, mídia, cultura, serviços e outras atividades. Pedro de Lamare também lembrou a importância de valorizar atrativos além do tradicional circuito da Zona Sul e Centro. "Precisamos trabalhar atrações e ativos turísticos como o baile de charme Viaduto de Madureira, a Feira das Yabás e o Trem do Samba. Eventos incríveis, que pouca gente conhece e não fazem parte de um calendário efetivo da cidade", observou. Essa diversidade é essencial para um destino turístico como o Rio, explicou. Pedro ainda classificou como um turismo de convivência o do Rio de Janeiro, por isso "a cidade precisa estar mais que preparada com equipamentos turísticos e culturais, informação e sinalizações para receber essa pessoa que vem viver o Rio".
O empresário assumiu que o setor que representa ainda precisa avançar. "Somos os maiores empregadores da cidade, empregamos mais que o dobro de todas as atividades econômicas na faixa de 18 a 24 anos. Mas quando você vai ver qual o preparo que essa mão de obra tem para vencer esse desafio de receber esses milhões de turistas, começa a entender as dificuldades existentes, como a escola pública de péssima qualidade", criticou.
Novos arranjos na cidade e desafios à frente
Presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade e do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural, Washington Fajardo tem participado da formulação de projetos que estão mudando estruturalmente a cidade. Citando a autora Elisabeth Bishop, Fajardo anunciou que pretendia provar exatamente o contrário: "Acredito como cidadão e arquiteto que o Rio é a cidade do espírito humano do século XXI", define o arquiteto. Ele ressaltou muitos esquecem da própria presença humana, em favor da paisagem e do sítio "maravilhoso do Rio", ainda fortes vários atrativos turísticos.
Existe uma cidade dentro da natureza que historicamente tem qualidade e capacidade de produzir um ecossistema urbano muito propício à atividade turística
Entre as atrações humanas da capital carioca, Fajardo citou a sustentabilidade e a diversidade cultural, "que o Rio concentra com muita qualidade. E essa condição especial está presente na construção urbana da cidade". O presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade explicou que quando a Unesco reconheceu a paisagem cultural da cidade, indicou também o que se fez nela; fator que explica o status de síntese da cultura brasileira. "Existe uma cidade dentro da natureza que historicamente tem qualidade e capacidade de produzir um ecossistema urbano muito propício à atividade turística".
Fajardo ainda fez questão de elencar três aspectos que caracterizam o Rio de Janeiro hoje: urbanidade latente, novo arranjo na região central e novos desafios para essa cidade escondida na natureza. A urbanidade latente diz respeito a todas as transformações, desde chegada da família Real em 1808, passando pelas várias intervenções no século XIX "criando infraestrutura e transformando essa paisagem". Um contexto capaz de atrair pessoas interessadas na experiência urbana do Rio de Janeiro. "Somos ricos dessa ambiência urbana, e essa urbanidade pode gerar arranjos e uma diversidade econômica muito mais sustentável, com uma rede de atividades econômicas, do que uma única atividade turística pontual".
O urbanista Fajardo comentou com entusiasmo o "novo arranjo espacial que surge na região central do Rio". Citou a derrubada da perimetral, a possibilidade de liberar a frente marítima e a criação de circuitos ligando os espaços culturais que se concentram na região. Transformações que prometem mudar a relação do cidadão e do visitante com a área, promete. "Não é mais pegar o carro e ir ao CCBB. É você ter a oportunidade de caminhar por um verdadeiro corredor cultural. E com ticket cultural, ir ao MAR, ao Museu do Amanhã, ao Museu de Arte Moderna e a um pavilhão do Museu da Imagem e do Som que existirá nessa região portuária".
O arquiteto falou também sobre os desafios que temos diante dessa cidade escondida nessa natureza. Para Fajardo, é preciso definir suportes eficientes para essas novas condições. "Boa parte do sucesso do MAR, por exemplo, se deve ao tipo de organização que tem, uma OS (Organização Social) que dá uma serenidade de gestão. E com resultados positivos: um museu novíssimo com números de sucessos de visitações e realizações importantes". Ele citou as parcerias público-privadas, as famosas PPPs, como forma de dar eficiência a esses novos arranjos. "Hoje, o estado brasileiro tem dificuldade em licenciar um café num espaço público, como o Passeio Público". Buscar o apoio da iniciativa privada seria uma alternativa para o Parque do Flamengo, por exemplo, que mesmo sendo sede de inúmeros eventos e destino de lazer para muitos, ainda sofre com problemas de conservação. Outro desafio para o Presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade é preservar as instituições frágeis e marcantes da cultura carioca, como os botequins, da alta nos custos de aluguéis que vem fechando negócios tradicionais, com incentivos fiscais específicos.
"Quero concluir com esses três pontos, que entendo, articulados: uma cidade que é importante na paisagem, uma nova transformação em curso e um novo arranjo da região do centro, e dentro dessa possibilidade, os desafios que surgem: de construir uma leitura e ações mais concretas de utilização da cidade, bem pactuada entre estado brasileiro, sociedade civil e setor de privado".
A cidade e suas instituições
A experiência turística do Rio de Janeiro é muita associada à natureza. O que temos agora é a oportunidade de ocupar esse espaço com novos atrativos culturais
Consultor de comunicação e especialista em branding, Luís Marcelo Mendes discutiu o museu e seu papel de atração turística em cidades como Paris, Nova York e Madri. "A experiência turística do Rio de Janeiro é muita associada à natureza. O que temos agora é a oportunidade de ocupar esse espaço com novos atrativos culturais", observou o jornalista, que trabalha na Fundação Roberto Marinho nos desenvolvimento dos projetos do novo Museu da Imagem e do Som (MIS) e do Museu do Amanhã.
Nas capitais europeias, os museus atraem números colossais de visitantes. "O Louvre recebe anualmente 9,7 milhões de pessoas e espera 12 milhões de visitantes em 2025", citou. Por isso, os museus são entendidos hoje, na dinâmica turística, como ’drives’ importantes das grandes metrópoles do mundo, explicou Mendes. Fato que pode ser comprovado pelo processo de expansão de museus, como o Museu de Arte Moderna em Nova York, o Moma, e pela criação de novos.
Para Luís, esses novos museus poderão ter papel significativo na atração de turistas para o Rio e na dinamização da economia. Uma dificuldade para isso é que os números relacionados a essas instituições não sejam disponíveis ou organizados, por exemplo, não se tem ideia das receitas nos museus no Rio de Janeiro, criticou o especialista em marketing. "O investimento é enorme para uma exposição, mas para um estudo aprofundado não se gasta a mesma energia e dedicação", compara Luís.
A construção de uma reputação para essas instituições será outro grande desafio. "Será que estamos confortáveis para entender museus como negócio, como prestador de um serviço relevante para a sociedade, ou ainda, para entender museus como marcas?", provocou. O consultor de branding disse que falta aos museus repensarem a sua gestão como verdadeiras marcas. "Museus são marcas e marcas pressupõem promessa e entrega", enfatiza o consultor.
Além do branding, ele apontou como importantes o trabalho em rede entre as várias instituições e a valorização do público. "O mais importante nos museus não é o acervo, são as próprias pessoas".
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