Em debate simultâneo à votação da redução da maioridade penal que ocorria na Câmara dos Deputados, ativistas e advogados contrários à proposta em pauta apresentaram alternativas. Se cumprido à risca e atualizado, Estatuto da Criança e do Adolescente se torna ferramenta ideal para combater violência e proteger a juventude.
Atualização (01/07, às 17h58): Embora tenha anunciado ontem (30/6) que o texto original da redução da maioridade penal só seria votado novamente em julho ou na próxima semana, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, afirmou que colocará em votação ainda hoje um texto quase idêntico ao rejeitado ontem. A diferença é a tipificação dos crimes nos quais valerá a maioridade penal de 16 anos, que nesta nova "emenda aglutinativa" exclui os crimes de roubo e tráfico de drogas.
***
Enquanto a Câmara dos Deputados rejeitava ontem (30/6) a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduzia a maioridade penal de 18 para 16 anos em crimes hediondos, ativistas e pesquisadores se reuniam no Centro do Rio para pensar alternativas à redução. A reformulação de pontos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi uma das ideias mais mencionadas.
Nesse terceiro debate da série "Mais Convivência, Menos Violência", organizado pelo jornal O Dia e pelo Observatório de Favelas, estavam o Cardeal Arcebispo Dom Orani João Tempesta; o educador Jailson Silva, diretor do Observatório de Favelas; Átila Roque, diretor da Anistia Internacional; e a advogada Ericka Gavinho, do Circo Crescer e Viver — onde foi realizado o evento. O editor de O Dia Andre Balocco mediou a conversa.
Embora a PEC tenha sido rejeitado ontem, os deputados ainda votarão o texto original, que reduz a maioridade penal para 16 em qualquer crime. Para Átila Roque, da Anistia Internacional, a aprovação de qualquer redução significará que o jovem brasileiro, já sistematicamente abandonado pela sociedade, se transformará no inimigo número um. "Estamos prestes a destituir o adolescente de sua humanidade quando o definimos por seu ato", afirmou Átila.
O diretor da Anistia Internacional também lembrou que o jovem negro é o que mais morre no Brasil: mais de 80% dos homicídios no país são de jovens e, destes, 77% são de jovens negros. "O destino do jovem brasileiro vai ser morrer assassinado ou penar nas prisões do país", afirmou Átila.
Estatuto da Criança e do Adolescente não é cumprido
"O Brasil não é o país da impunidade", apontou Éricka, advogada do Circo Crescer e Viver. Ela lembrou que o país tem a quarta maior população carcerária do mundo. com mais de 500 mil presos — dos quais 40% deles ainda não foram julgados.
No caso de menores de idade, Éricka falou que o país tem mais de 20 mil adolescentes cumprindo medidas socioeducativas por terem cometido atos infracionais. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), contudo, que legisla sobre esses casos, não é cumprido de fato, para a advogada. "Se o estatuto fosse cumprido, não estaríamos nesta situação agora", opinou.
Para Jailson Silva, diretor do Observatório de Favelas, o principal problema do ECA é o grau de judicialização do instituto — ou seja, a necessidade de intervenção judiciária em quaisquer encaminhamentos que se venha oferecer ao adolescente. "O ECA já tem 25 anos e precisa ser reavaliado", argumentou.
A necessidade de uma avaliação do estatuto e de seu cumprimento também foi mencionada por Dom Orani, para quem a redução da maioridade penal "só vai colocar o menor na pós-graduação do crime" — as prisões. "Estamos criando cada vez mais leis, judicializando tudo, mas sem garantir que são cumpridas", avaliou o cardeal.
Segundo Jailson, a sociedade manifesta duas posturas em relação à juventude pobre: que deve ser "domesticada" — engolida por empregos institucionalizados — e, quando não isso não acontece, que os jovens devem ser presos. Para o educador, também é importante valorizar e estimular o contato desses jovens com manifestações culturais e artísticas menos ’institucionalizadas’. "Quanto mais invisibilizados e domesticados, melhor. Para quem não se enquadra, prisão", explicou Jailson, sintetizando a visão do senso comum.
Maioria dos brasileiros é a favor
Como seria de se esperar, além dos debatedores, todo o público que participou da discussão era contra a redução da maioridade penal. Isto é, exceto Alessandro, de 14 anos, aluno do Circo Crescer e Viver. Na rodada de perguntas, o jovem pediu a palavra e disse, com bastante eloquência: "O adolescente de 16 anos tem a mesma consciência de um de 18." O rapaz foi aplaudido por um grupo de amigos sentado na arquibancada do circo.
A presença de Alessandro na plateia é um lembrete importante quando se pensa sobre o tema: segundo uma pesquisa do Datafolha, 87% dos brasileiros querem a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.
Segundo o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, a votação da proposta original da redução da maioridade penal deverá acontecer na próxima semana — ou somente depois do recesso parlamentar de julho.
Prometida por Eduardo Paes para o ano passado, obra depende agora do aval de Marcelo Crivella
Visitante acusa namorado de funcionária de discriminação durante ida ao local na última sexta (30)
Livro reúne soluções mirabolantes já propostas para os problemas de um dos principais cartões-postais do Rio