O concurso de projetos do Morar Carioca previa ações de integração social e investimento na participação; ao menos na comunidade ’Barreira do Vasco’, do escritório Heitor Derbli, equipamentos dedicados à formação profissional foram eliminados; Ibase, que seria responsável pela interlocução comunitária, teve contrato descontinuado
Foto: Comunidade Barreira do Vasco
Dos dez escritórios contratados pelo concurso do Morar Carioca e contatados pelo Vozerio , o Heitor Derbli e Arquitetos Associados foi o primeiro a ser contratado e o único em fase de realização de obras. Mesmo assim, os titulares do projeto, Heitor Derbli e Gabriel Carvalho Soares relataram ao Vozerio sua insatisfação com a redução das intervenções na comunidade Barreira do Vasco, situada próxima ao estádio de São Januário, sede do Clube de Regatas Vasco da Gama.
"Houve uma amputação da criatividade do projeto”, disse Heitor. Uma das propostas não realizadas era a construção da Cidade do Samba 2, que chegou a ser notícia na coluna de Ancelmo Gois. Outra seria uma sede do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), de ensino profissionalizante para a indústria têxtil, setor historicamente presente no bairro de São Cristóvão. A iniciativa teria como objetivo incentivar grupos de artesanato que já atuam no lugar, assim como a produção de fantasias e alegorias da nova Cidade do Samba. “Existe um grupo na comunidade, chamado Retalho Carioca. São de moças que passam pelas varias indústrias têxtis que existem no bairro de são Cristóvão e pegam os retalhos e fazem diversas customizações”, disse Gabriel.
Em nota, a Secretaria Municipal de Habitação afirmou que "esses equipamentos propostos no plano de intervenção foram retirados por não serem equipamentos compatíveis com a escala de intervenção".
“Você pode dizer que está integrando a cidade quando coloca a rede de infraestrutura, iluminação e recolhe resíduos sólidos. De fato está integrando o ambiente, só que não necessariamente os tecidos sociais. A nossa proposta inicial deste esse equipamento urbano acabou não sendo aceita”, explica o coordenador do agrupamento Gabriel Carvalho Soares, afirmando que equipamentos como esses poderiam beneficiar não só a comunidade como todo seu entorno.
Programa reodernado
Uma troca de cargos dentro da SMH é um dos motivos mais mencionados para as mudanças no programa. Em 2012, o secretário municipal de habitação, Jorge Bittar (PT) foi substituído no cargo por seu subsecretario, Pierre Batista. Hoje, quem está a frente do cargo é Carlos Francisco Portinho.
“Não sabemos se foi a troca que influenciou [o reordenamento] ou a influência foi anterior para gerar a troca [de secretários]. Mudou o viés do projeto e o interesse que o governo do município tinha em levar a cabo a proposta inicial de interação socioeconômica e cultural no desenvolvimento das comunidades”, pondera o arquiteto Heitor Derbli. Questionada se a troca entre Jorge Bittar e Pierre Batista - provocou um reordenamento do programa, em resposta a SMH afirmou que sim, mas não deu mais detalhes sobre o ocorrido. O ex-secretário Jorge Bittar, hoje presidente da Telebras, não retornou ao pedido de entrevista.
A realização dos projetos aprovados no concurso tinha como parceiro o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), responsável pela mediação entre a comunidade e os escritórios de arquitetura e urbanismo. Através de diversas atividades - rodas de diálogo, oficinas de memórias e sonhos; e fóruns - a intenção era levantar demandas, a partir da escuta dos próprios moradores. Aliás, a participação popular era um dos destaques do programa, até pelo histórico de críticas nesse tema em programas de urbanização e habitação popular na cidade.
Mas, segundo Sandra Jouan, socióloga e pesquisadora do Ibase, durante o período de transição após a troca de secretários, o Ibase teve seu contrato suspenso temporiamente. O prazo do contrato acabou em outubro do ano passado, sem que a instituição retornasse ao programa. “Entre fevereiro a outubro de 2014 mandamos diversos ofícios para a Prefeitura e não tivemos nenhum retorno. Tínhamos contratado agentes comunitários e supervisores de campo. E tivemos que romper contrato com essas pessoas com recursos do próprio Ibase”.
Em reposta, a SMH explicou que "O Ibase atendeu a primeira etapa dos contratos, nas outras etapas os serviços ficaram sob a responsabilidade dos Projetos".
O escritório, o Aucasulo, responsável por comunidades nas áreas de Praça Seca e Tanque, afirma que “o Programa redirecionou seu foco para privilegiar a infraestrutura – saneamento básico ambiental, em detrimento da produção de arquiteturas voltadas para o desenvolvimento de projetos de habitação, de espaços e equipamentos públicos - creches, por exemplo”.
Para o arquiteto Heitor Derbli, a Prefeitura “teve que investir em desenvolvimento urbano e não social. Faltou desenvolvimento social nesse projeto [Morar Carioca]”.
Um legado olímpico que anda a passo lento
Havia um BRT no meio do caminho
O programa Morar Carioca é alvo de críticas por não realizar o previsto. "Esse era o principal legado das Olimpíadas de 2016 e foi para o brejo", diz o arquiteto Luiz Fernando Janot
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