Grupos se organizam para protestar contra a agressão a três jovens negros por cinco seguranças do Saara na última sexta (22). Os agressores registraram a sessão de tortura em vídeo, que vazou na internet e mostrou que violência contra grafiteiros e pichadores é frequente.
Grafiteiros e pichadores estão se organizando para protestar contra o caso de agressão de três jovens grafiteiros na última sexta (22) por cinco seguranças do Saara (Sociedade de Amigos das Adjacências da Rua da Alfândega). O episódio foi gravado por um dos agentes. O vídeo foi recebido por adeptos da arte de rua e começou a ser divulgado nesta terça (26), gerando revolta nas redes sociais.
Até agora, está programada uma manifestação na rua da Alfândega, no Saara, no próximo domingo (31). "Vamos nos reunir nesta sexta [29] para decidir como vai ser o protesto", explicou ao Vozerio Marcio Graffiti, um dos organizadores do evento no Facebook, batizado de "Graffitaço da Paz no Saara".
Também na sexta, os grafiteiros pretendem elaborar um manifesto com o objetivo de esclarecer os profissionais de segurança sobre o que é grafite e como abordar os artistas. "Nossa intenção agora é fazer um trabalho grande de esclarecimento. Violência gera violência. A gente não pode se igualar a eles", declarou o grafiteiro Dante. "Uma parada dessas não pode acontecer numa cidade que vai ser sede de olimpíada", afirmou.
Publicado por Dante Urban em Terça, 26 de janeiro de 2016
De acordo com o relato de um dos jovens agredidos, ele e mais dois amigos voltavam de um evento de grafite em Santa Tereza quando tudo aconteceu. Na altura da Central do Brasil, o grupo foi abordado pelos seguranças do Saara, que encontraram latas de tinta nas mochilas dos jovens.
Os seguranças obrigaram os adolescentes a tirar as roupas e os pintaram de branco. Além disso, espancaram os grafiteiros com uma barra de ferro. "Desculpa é o caralho", afirma um dos seguranças em certo momento do vídeo, batendo com a barra de ferro no jovem. Um dos agredidos informou no Facebook que teve duas fraturas na perna em função das agressões (veja a foto abaixo).
Embora os agressores acusem os adolescentes de pichadores no vídeo, eles afirmam que não estavam pichando. Dante corrobora essa versão: "Pichador não sai com lata de tinta de parede", esclareceu o grafiteiro.
O caso gerou revolta entre os artistas do Rio ligados ao grafite e ao picho. "A tortura é um crime muito maior do que a arte de rua", afirmou a grafiteira carioca Panmela Castro, em entrevista ao Vozerio.
As imagens impactantes do vídeo chocaram mesmo quem convive com a violência. "Não consegui ver o vídeo inteiro. Fiquei com vontade de chorar, me deu muita raiva", desabafou ao telefone o pichador XLMX. Ele contou também que as agressões a grafiteiros e pichadores por parte de seguranças e até da PM são frequentes. "Uma vez tomei uma dura quando estava descendo a rua de casa. Fui parado pela polícia, que me colocou dentro do carro, me levou para um ponto um pouco mais afastado e me bateu, além de jogar minhas tintas na Dutra", contou XLMX, morador de São João de Meriti.
O pesquisador Gustavo Coelho, professor da Faculdade de Educação da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), foi outro que se indignou com a história. "O Rio é uma cidade que valoriza muito mais o muro do que a vida", defendeu ele, que desenvolveu teses de mestrado e doutorado sobre arte de rua. Segundo Coelho, agressões acontecem com frequência com pichadores, mas são mais raras no meio do grafite.
O grafiteiro Meton Joffily concorda. "É mais comum esse tipo de situação acontecer com a pichação, ou quando se faz grafite num lugar proibido à noite. Por isso que evito", contou ele. Joffily disse já ter sido pego pro seguranças, mas que não foi agredido. "Mas dava para saber que eles estavam armados. Um deles falou: ’Quase dei um tiro no meio das tintas para ver se vocês se ligavam’".
Para Joffily, a legitimação de certos nomes da arte de rua é um dos "perigos" que acarretam situações de violência para os pichadores e grafiteiros. "Alguns são eleitos como bons; vão para galerias, para os tênis, são aceitos pelo mundo das ’coisas oficiais’. Então se você se expressa de uma forma é aceito na galeria; caso se expresse de outra é espancado?", questiona o grafiteiro.
Além da cor, do bairro e da renda, o gênero é outro fator de discriminação no mundo da arte de rua. "Ser mulher é problema em qualquer lugar. A gente sofre machismo de todo lado: de polícia, de grafiteiro. O mundo do graffiti é muito masculino ainda, temos poucas grafiteiras", opinou a artista urbana Lya Alves, idealizadora do Projeto Philosoffitti, em Niteroi.
Alves lembra que a pichação no Brasil é considerada crime ambiental, com pena de detenção de três meses a um ano, além de multa. "Mas não está previsto na lei que a polícia ou qualquer ’segurança’ possa fraturar a perna de um jovem", provocou a artista. Já o grafite foi regulamentado pela Prefeitura do Rio em 2014, com o decreto GrafiteRio.
Atualização: o protesto que iria ser realizado no dia 21/02 foi transferido para domingo próximo, 31/01.
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